segunda-feira, 10 de setembro de 2012

‘Ciência sem Fronteiras’ – importações ainda são um impasse



















Essa iniciativa que tem merecido destaque da imprensa  e apoio da presidente Dilma foi aplaudida por todos os cientistas e por aqueles que acreditam que o desenvolvimento de um país passa pela ciência e tecnologia. A ciência não possui fronteiras. Ela é universal. O programa “Ciência sem Fronteiras” prevê a ida de 100.000 estudantes brasileiros para universidades do exterior nos próximos anos. A expectativa é que ao voltarem, eles tragam na bagagem novas tecnologias, novas maneiras de pesquisar e impulsionar a ciência e o estabelecimento de intercâmbio científico com  laboratórios internacionais. Do mesmo modo que a presidente Dilma afirmou recentemente que incentivos fiscais serão dados a empresas brasileiras para gerar empregos, esse apoio prevê a formação de jovens cientistas que possam ter impacto na ciência brasileira.
Entretanto, para que esse programa possa ter sucesso dois aspectos são fundamentais:

1) Deve haver critérios científicos muito bem embasados para selecionar os estudantes, os laboratórios que vão recebê-los no exterior e os projetos de pesquisa. A recusa do CNPq em apoiar certos projetos ou  dar bolsas a alguns estudantes tem se baseado na opinião de  pesquisadores  qualificados que analisam cuidadosamente todos esses pontos. Além disso, temos visto casos de estudantes brasileiros radicados no exterior, que não têm nenhuma intenção de voltar ao Brasil, mas veem nessas bolsas a possibilidade de receber um auxílio adicional em condições muito menos competitivas que as exigidas no primeiro mundo.

2) Ao voltar, os estudantes precisam encontrar no Brasil laboratórios com condições comparáveis às do exterior para desenvolver suas pesquisas. Caso contrário todo o investimento terá sido inútil. Nesse sentido, um aspecto fundamental refere-se à agilidade para importar insumos para pesquisas. Temos batido nessa tecla repetidamente. Várias iniciativas positivas já  foram tomadas pelos órgãos públicos e agências de fomento, mas ainda estamos longe do ideal. Continuamos com grandes empecilhos. Algumas medidas muito simples poderiam fazer uma enorme diferença e o melhor de tudo, gerar uma enorme economia não só de tempo, mas também de recursos. Poderíamos fazer muito MAIS com MENOS.

COMO DEVERIAM SER AS IMPORTAÇÕES DE INSUMOS PARA PESQUISA CIENTÍFICA?

Quais são os entraves? 

O Brasil que destaca-se mundialmente pela eficiência em programas de votação ou declaração de imposto de renda por meio eletrônico ainda usa  papel, carimbos e assinaturas (do pesquisador responsável e do dirigente da instituição) para autorizar cada reagente a ser importado para projetos de pesquisa. Isso, sem falar dos despachantes e burocracias para liberar os produtos da alfândega. Ou das greves que paralisam tudo. Gasta-se muito mais tempo para viabilizar uma pesquisa do que para executá-la. É dificil de acreditar, não?  Com isso insumos requeridos para experimentos científicos inovadores – que chegam em apenas algumas horas às mãos dos pesquisadores no primeiro mundo, permitindo que testam imediatamente suas ideias -  levam semanas e às vezes meses para chegar aos laboratórios brasileiros. Como competir com laboratórios internacionais de ponta quando a rapidez na pesquisa é crucial? Impossível.

Como mudar esse quadro? Qual é a receita?

É muito simples.

1)  Todos os pesquisadores brasileiros nas universidades ou institutos de pesquisas estão cadastrados no sistema Lattes do CNPq, uma plataforma excelente.  Basta colocar o nome e aparece a sua biografia científica e linhas de pesquisa.

2)  Com raras exceções, os reagentes necessários para as pesquisas são conhecidos, catalogados e já aprovados por agências reguladoras nacionais e  internacionais. Bastaria ter uma lista de todos eles em bancos de dados acessíveis para qualquer pesquisador, via internet.

3)  As agências financiadoras ao apoiar e destinar recursos aos projetos de pesquisas alocam um certo montante para material importado. Porque não vincular esse valor a um cartão de crédito com o nome do pesquisador responsável  no mesmo limite aprovado para pesquisa?
Como seria na prática o programa ?

Toda vez que um pesquisador – já cadastrado – precisasse de um reagente bastaria colocar o nome do produto  e solicitar sua importação. O programa “importe-pesquisa” ou “ reagentes sem fronteiras” localizaria o código do material, o fabricante e deduziria o valor do total de verbas de importação do pesquisador. E o melhor de tudo. O produto poderia ser entregue diretamente ao pesquisador pelo fabricante, no seu laboratório, sem ter que passar por alfândega, despachante e outros entraves burocráticos. Do mesmo modo que se importam livros.
Quais seriam as vantagens?

Além da agilidade para importar material de pesquisas esse sistema poderia gerar uma grande economia não só dispensando os agentes intermediários, mas permitindo que se importasse somente o reagente necessário para aquele experimento, sem necessidade de estoques, perda de material etc..  Cada pesquisador seria o responsável pelos insumos importados.

Presidente Dilma, dê um voto de confiança aos cientistas brasileiros

Repito aqui um apelo que  já fiz várias vêzes:  presidente Dilma, dê um voto de confiança aos pesquisadores. Tenho certeza que essas medidas, se implementadas, serão aplaudidas por todos os cientistas brasileiros e por aqueles que lutam por um país melhor. Elas poderão ser fundamentais  para que o programa “Ciência sem Fronteiras” alcance os objetivos desejados e resulte em um salto qualitativo na ciência e tecnologia do Brasil.

Por Mayana Zatz para a Revista Veja.

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