A Sociedade Brasileira de
Genética (SBG) vem a público comunicar que não existe qualquer
respaldo científico para ideias criacionistas que vêm sendo divulgadas em
escolas, universidades e meios de comunicação. O objetivo deste comunicado é
esclarecer a sociedade brasileira e evitar prejuízos no médio e longo prazo ao
ensino científico e à formação dos jovens no país.
A Ciência
contemporânea é a principal responsável por todo o desenvolvimento tecnológico
e grande parte da revolução cultural que vive a sociedade mundial. A Biologia
do século XXI começou a se fundamentar como uma Ciência experimental bem estabelecida
com a publicação das primeiras ideias sobre Evolução Biológica por Charles
Darwin e Alfred Wallace, em meados do século XIX. Esta Teoria científica
unifica todo o conhecimento biológico atual em suas várias disciplinas das
áreas da saúde, ambiente, biotecnologia, etc. Além disso, a Teoria Evolutiva
explica, com muitas evidências e dados experimentais, a origem e riqueza da
biodiversidade, incluindo as espécies existentes e extintas, de nosso planeta.
Como as
Teorias de outras áreas da Ciência, como Física (Gravitação, Relatividade, etc)
e Química (Modelo Atômico, Princípio da Incerteza, etc), a Evolução Biológica
está fundamentada no método científico, investigando fenômenos que podem ser
medidos e testados experimentalmente. O processo científico é contínuo,
incorporando constantemente as novas descobertas e aprofundando o conhecimento
humano sobre os seres vivos, a Terra e o Universo. É isso que temos visto
acontecer com o estudo da Evolução Biológica nos últimos 150 anos, período no
qual uma enorme quantidade de dados confirmou e aprimorou a proposta original
de Darwin e Wallace. No entanto, as perguntas e as causas sobrenaturais
não fazem parte do questionamento hipotético e nem das explicações em todas as
Ciências experimentais modernas. Por exemplo, a pergunta “Deus existe?” pode
ser discutida por filósofos e cientistas (como pessoas com diferentes crenças,
opiniões e ideologias), mas não pode ser abordada e respondida pela Ciência.
Frequentemente são divulgados fenômenos que não podem ser explicados por
uma Ciência devido a limitações do conhecimento no século XXI, tal como a
gravidade no nível atômico, algumas propriedades da molécula da água ou a
evolução das primeiras formas de vida há mais de 3,5 bilhões de anos. Para temas
como estes, algumas pessoas argumentam com variantes de uma clássica falácia:
“se a Ciência não explica, é porque a causa é sobrenatural”. Este argumento é
utilizado por inúmeros criacionistas, incluindo os adeptos da Terra Nova, da
Terra Antiga e da crença do Design Inteligente. Curiosamente, algumas dessas
versões criacionistas se apresentam ao grande público como produto de “estudos
científicos avançados”, como se fossem parte da atividade discutida em
congressos científicos em diversos países, no Brasil inclusive. Nessas versões,
a Teoria Evolutiva é deturpada, como se pouco ou nenhum trabalho científico
tivesse sido efetuado desde sua proposta há mais de 150 anos, demonstrando um
total desconhecimento dos milhares de resultados e evidências que consolidam
essa Teoria. Alguns raros criacionistas são cientistas produtivos em suas áreas
específicas de atuação, que não envolvem pesquisas na área da Evolução
Biológica. Mas quando abordam o criacionismo, falam de sua crença particular e
não das pesquisas que estudam e publicam. Como perguntas e explicações
criacionistas não podem ser testadas pelo método científico, estes
pesquisadores estão apenas emitindo uma opinião pessoal e subjetiva, motivada
geralmente por uma crença religiosa.
Com o
objetivo de informar à sociedade, inúmeros cientistas, filósofos e educadores
da área biológica têm apresentado várias críticas substantivas às diferentes
versões criacionistas, demonstrando seus alicerces na crença e não no
questionamento científico, erros elementares e significativas falhas
conceituais em sua formulação, a falta de evidências, assim como deturpações
dos fatos e métodos científicos. Essas críticas têm sido divulgadas no Brasil e
em vários países, sendo que algumas podem ser lidas nos sites da internet
indicados abaixo. Reconhecendo que a divulgação destas ideias criacionistas
representa uma deterioração na qualidade do ensino de Ciências, a Sociedade
Brasileira de Genética (SBG) vem aqui ratificar que a Evolução Biológica por
Seleção Natural é imensamente respaldada pelas evidências e experimentações nas
áreas de Genética, Biologia Celular, Bioquímica, Genômica, etc. Além disto,
reiteramos que, como qualquer outra Teoria científica, a Evolução Biológica tem
sido remodelada com a incorporação de várias novas evidências (incluindo da
área de Genética), tornando suas hipóteses e explicações mais complexas e
robustas a cada ano, desde a primeira publicação de Charles Darwin em 1859.
Esta
manifestação da SBG visa comunicar de forma muito clara à Sociedade Brasileira
que não existe qualquer respaldo científico para ideias criacionistas
(incluindo o Design Inteligente) que têm sido divulgadas em algumas escolas,
universidades e meios de comunicação. Entendemos que explicações baseadas na fé
e crença religiosa, e no sobrenatural podem ser interessantes e reconfortantes
para muitas pessoas, mas não fazem parte do conteúdo da pesquisa ou de
disciplinas científicas nas áreas de Biologia, Química, Física etc. Ao lado do
respeito à liberdade de crença religiosa, deve ser também observado o respeito
à Ciência que tem enfrentado todo tipo de obscurantismo político e religioso,
de modo similar às situações vividas por Galileu Galilei e o próprio Charles
Darwin. Mesmo com toda a limitação do método científico e dos recursos
tecnológicos em cada época, a Ciência alargou o conhecimento humano e o
entendimento científico dos mais diversos fenômenos. A SBG reitera os
princípios que vem defendendo ao longo de seus 58 anos de existência e reafirma
que o ensino da Ciência, em todos os níveis, deve se dedicar à sua finalidade
precípua, em respeito ao ditame constitucional da qualidade da educação, sem
deixar-se perverter pela pseudociência e pelo obscurantismo político ou
religioso.
Alguns criacionistas também utilizam o argumento de
que a Ciência brasileira é retrógrada (ou “tupiniquim”, como a chamam),
afirmando que o criacionismo é “aceito” no exterior, mas a Ciência é unânime em
todos os países sobre este assunto, o que pode ser verificado no final deste
documento em vários textos parecidos com este, sancionados por organizações
científicas e educacionais de várias partes do mundo.
Concluímos que, embora o criacionismo possa ser abordado como explicações não
científicas em disciplinas de religião e de teologia, estas versões
criacionistas não podem fazer parte do conteúdo ministrado por disciplinas
científicas. Entendemos que o ensino científico de boa qualidade no Brasil e em
outros países depende da compreensão da metodologia científica, de suas potencialidades
e de suas limitações, além da discussão de evidências e dados experimentais. No
entanto, interpretações e ideias pseudocientíficas (criacionismo, astrologia
etc) prejudicam seriamente o Ensino Científico de qualidade e o desenvolvimento
do país.
Documentos
oficiais divulgados por organizações científicas e educativas
Resolução da Associação Americana para o Avanço das Ciências (AAAS -
EUA)
www.aaas.org/news/releases/2002/1106id2.shtml
www.aaas.org/news/releases/2002/1106id2.shtml
Texto oficial da National Academies dos EUA que congrega a
Academia Nacional de Ciências (NAS), Academia Nacional dos Engenheiros,
Instituto de Medicina e Conselho Nacional de Pesquisas
http://nationalacademies.org/evolution/IntelligentDesign.html
http://nationalacademies.org/evolution/IntelligentDesign.html
Centro Nacional para Educação Científica (NCSE - EUA)
http://ncse.com/creationism
http://ncse.com/creationism
Academia Australiana de Ciências (Austrália)
http://www.science.org.au/policy/creation.html
http://www.science.org.au/policy/creation.html
Conselho de Ciências do Reino Unido
http://www.sciencecouncil.org/content/scientific-opinion-creationism-and-intelligent-design
http://www.sciencecouncil.org/content/scientific-opinion-creationism-and-intelligent-design
Centro Britânico para Educação Científica (Reino Unido) – destacando a
estratégia criacionista na imprensa e escolas, tentando deturpar o ensino
científico
http://www.bcseweb.org.uk
http://www.bcseweb.org.uk
Sociedade Internacional sobre Ciência e Religião (Reino Unido)
http://www.issr.org.uk/issr-statements/the-concept-of-intelligent-design
http://www.issr.org.uk/issr-statements/the-concept-of-intelligent-design
Ensinando Ciência – artigo da UNESCO sobre importância dos princípios e
conceitos científicos na educação
http://www.ibe.unesco.org/fileadmin/user_upload/Publications/Educational_Practices/EdPractices_17po.pdf
http://www.ibe.unesco.org/fileadmin/user_upload/Publications/Educational_Practices/EdPractices_17po.pdf